Danoninho


Olhou para frente mais uma vez e teve certeza: era ele. Poderia se esconder entre as dezenas de prateleiras do supermercado, mas correr o risco de ser vista fugindo entre as bananas e as melancias era infinitamente pior. Ele estava de lado, colocando um cacho de uva branca num saco plástico. Quando fosse pesar suas frutas, obviamente a veria. O que fazer? Disfarçar? Sorrir? Erguer um melão pra tapar o rosto? Os quatro milésimos que restavam não foram suficientes para tomar uma decisão tão complexa.

Eduardo viu Luisa. Viu suas havaianas slim, viu sua blusinha verde e viu seu short jeans. Ela viu seu tênis nike, sua bermuda azul e sua camiseta branca. E seu sorriso com uma centena de dentes brancos, seus olhos escorrendo açúcar e seu cabelo meio em pé. O estômago de Luísa doeu nessa hora. Comoassim a encontrar no supermercado numa tarde de sábado? Que a encontrasse na rua, descabelada e com sorvete no canto da boca, mas não com aquela cara de criança assustada que tinha certeza que estava estampando. Tarde demais. Tinha que se mostrar adulta, bem resolvida, interessante, magra, inteligente, educada, feliz e simpática.

Ela: Oi...
Ele: Oi!
(beijo na bochecha)
Ela, três tons mais vermelha: Comoassim, você aqui?!
Ele, dando um soco no estômago dela com seu sorriso: É, tava aqui perto e lembrei que precisava de umas coisas...
Ela: Uvas?
Ele: Não, as uvas não estavam nos planos.
Ela: Que bom te ver, faz quanto tempo...
Ele: É, vc parece estar muito bem. Tá até bronzeada...
Ela, esquivando-se de mais conversa: Artificial. Bom, tô com um pouco de pressa, vou indo. Nos vemos por aí.
Ele: Então tá, te cuida.

Os pés de Luisa a levaram para os laticínios, mesmo ela tendo saído dali há pouco, de onde pegara os danoninhos que estavam na sua cestinha. “Danoninhos? Droga, agora ele viu que eu amadureci um monte”, martirizou-se a moça. E não era só isso: ao lado dos danoninhos repousavam biscoitos passatempo e cenourinhas da Turma da Mônica. Ele estava rindo daquilo, teve certeza. No calor da hora, nem lembrou do que tinha na cestinha dele, além das uvas. Acha que viu uma caixa que podia ser de qualquer coisa, até bombons para alguém. Luisa se odiou por pensar como uma mulherzinha paranóica.

Devia ter falado com ele direito. Mas como ia acertar agora se sempre fazia tudo errado? Resignou-se e foi pro caixa. Lá, entre um bipe e outro, entendeu que não eram infantis apenas sua alimentação e suas roupas: ela era uma criança. Foi embora, conheceu outras pessoas, raramente o viu.

Eduardo gostava de Luisa porque ela era criança. Nunca conseguiu entender porque ela o evitou.

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